sábado, janeiro 06, 2007

Viagem ao planeta Google

Matéria da revista Época, 18/12/06

Como dois garotos da Califórnia criaram a cultura empresarial mais inovadora do mundo
JOÃO GABRIEL DE LIMA, de Mountain View

O google é a empresa que melhor traduz o espírito de nosso tempo. Ela está para o século XXI assim como Ford ou Coca-Cola estiveram para o século XX. A Ford inventou a linha de montagem e inaugurou a era do consumo de massa. A Coca-Cola, refrigerante químico que não imitava o sabor de nenhuma fruta, é o símbolo da era das marcas. O Google representa outra época - a era da inovação. A era em que uma boa idéia vale milhões de dólares. Ou bilhões.

O sistema de buscas do Google é uma idéia assim. Seus criadores, Larry Page e Sergey Brin, debruçaram-se sobre uma das questões cruciais de nosso tempo: num mundo dominado pela informação, como saber o que é relevante? Passaram noites em claro nos dormitórios da Universidade Stanford, em Palo Alto, na Califórnia, e chegaram a um método de busca, chamado "Page Rank", que hierarquiza as informações de acordo com o número de páginas da internet que as citam (por meio de links). Brin e Page tiveram uma única idéia genial - uma idéia de US$ 150 bilhões, valor aproximado do Google no mercado acionário. Em oito anos de existência, o Google já vale mais que a Coca-Cola.

Pode-se definir o Google como uma empresa em que 9 mil funcionários tentam ter uma idéia tão genial e tão valiosa quanto a que Brin e Page tiveram em 1998 e que deu origem à empresa. Estima-se que o Google, nos últimos três anos, tenha lançado um produto novo por semana.
Muitos são colocados no ar em caráter experimental e retirados em seguida. Por isso é difícil saber exatamente quantos tentáculos o Google possui. No momento em que você lê esta reportagem, há cerca de 40 produtos funcionando e mais 30 em caráter experimental.

A volúpia de lançamentos frenéticos e inacabados do Google se baseia em uma lógica empresarial ousada e pioneira: a companhia abre suas idéias para que os concorrentes as copiem e aperfeiçoem. Há um pensamento estratégico por trás desse aparente disparate. "Cada idéia lançada pelo Google é um potencial novo Google, pode ser um bilhete premiado", escreveu o analista Phillip Remek, da consultoria Guzman & Co, especializada em tecnologia. "Eles lançam tantos produtos para desnortear os concorrentes, são espertos o suficiente para saber que poucos seriam tão espertos para saber qual é o bilhete premiado com cinco anos de antecedência."

Das mais de 150 idéias que os 9 mil funcionários do Google tiveram nos últimos três anos, algumas são geniais. É o caso do Orkut, o site de relacionamentos que faz um tremendo sucesso no Brasil. Outras idéias inovadoras, o Google soube comprar dos próprios inventores. É o caso do Google Earth, o site em que é possível localizar qualquer lugar do planeta Terra e obter uma foto aérea com algum nível de detalhe, ou do célebre YouTube, o maior site de vídeos do mundo. O que torna o Google tão inovador?

O Google reflete o espírito de nosso tempo porque se localiza no lugar do mundo que está para os dias de hoje como Florença para a época renascentista: o Vale do Silício, na Califórnia. Em Florença, a prosperidade dos Médicis impulsionava os artistas por meio do mecenato. Na Califórnia, a economia mais pujante do mundo encontra seu pólo de vanguarda. Como costuma ocorrer nos focos de prosperidade econômica, é lá que aparecem as idéias inovadoras. Do eBay, que mudou o comércio, ao YouTube, que transformou radicalmente o mundo das imagens, é no Vale do Silício que surgem as iniciativas de maior impacto cultural na atualidade. O Google está no centro dessa efervescência. Um passeio por sua sede mostra como funciona a Florença do século XXI e como essa cultura gerou a empresa mais inovadora do mundo.

A CULTURA GOOGLE E OS "GOOGLEYS"

1. Ambiente de campus universitário
A sede do Google fica em Mountain View, cidadezinha da Califórnia a aproximadamente uma hora de trem de São Francisco. Três estações antes de Mountain View está Palo Alto, onde se localiza a Universidade Stanford, a segunda melhor dos Estados Unidos de acordo com o ranking elaborado anualmente pela revista semanal U.S. News and World Report (a primeira é Harvard). Page e Brin estudaram em Stanford. O Google foi lançado experimentalmente como o programa de buscas da biblioteca da universidade. A idéia toda foi desenvolvida com um orçamento de US$ 10 mil. Brin e Page acreditam que nenhum ambiente é mais inovador que uma universidade. No Googleplex, nome pelo qual é também conhecida a sede do Google, os dois tentam reviver o ambiente de Stanford, três estações de trem adiante.

Empresas de tecnologia gostam de usar a palavra campus para definir seus Q.Gs. Embora a Microsoft também faça isso, em nenhum lugar a denominação parece mais apropriada que no Google. A sede da empresa realmente parece uma faculdade. Os funcionários, em geral abaixo de 30 anos, costumam ir trabalhar com a mesma roupa com que iriam a um show de rock. Bermuda, boné e camiseta são trajes comuns. As baias de trabalho parecem quartos de adolescentes. Em geral são bagunçadas e adornadas por pôsteres de divas pop, como Britney Spears, ou esportistas, como Shaquille O'Neal. Ninguém é obrigado a trabalhar nas baias. Nos dias de sol - e eles são muitos na Califórnia, mesmo na região de São Francisco, conhecida pelo índice alto de chuvas -, é comum ver jovens sentados nos gramados do campus com seus laptops.

O guru do liberalismo, Milton Friedman, costumava dizer que em economia não existe almoço grátis. No Google existe. Os funcionários da empresa têm direito a três refeições gratuitas nas 11 cantinas do campus de Mountain View. O ambiente da empresa é multicultural. Há americanos, indianos, asiáticos, africanos. Assim também são as cantinas, de culinárias variadas. Uma delas, o 180 Café, serve apenas comida orgânica produzida a 180 milhas - aproximadamente 290 quilômetros - da sede. Como no campus de Stanford, as cantinas estão entre os lugares preferidos para as reuniões de trabalho, assim como os gramados. É freqüente passar pelas salas de reunião e verificar que estão vazias.

2. Horário flexível
Cada funcionário do Google tem cerca de 20% do tempo livre para desenvolver s projetos pessoais. Isso significa um dia por semana sem precisar prestar contas do que se está fazendo. Foi em seus dias livres que o programador turco Orkut Buyukotten criou o site de relacionamentos que leva seu nome, hoje um dos principais sucessos da rede. "Para os gerentes do Google, horário não é importante, a não ser que seja numa área de vendas onde há reuniões com clientes", diz Alexandre Hohagen, diretor do Google no Brasil. "O importante é cumprir as tarefas dentro do prazo." No campus de Mountain View, os funcionários são incentivados a ter horas livres durante o, por assim dizer, "expediente", palavra que parece pouco adequada para descrever o que se vê no Google. Existe uma piscina coberta, uma quadra de vôlei de praia, mesas de pingue-pongue e outros jogos, sala com videogames e academia de ginástica. Os projetos são desenvolvidos em grupos de três ou quatro pessoas. Page costuma dizer que isso recria, de certa forma, o espírito dos trabalhos na universidade. Há quem questione esse desperdício de tempo dos funcionários, dizendo que tal prática só é possível numa empresa rica como o Google. Pode ser que o modelo não seja exportável. Mas em Mountain View funciona perfeitamente.

3. Funcionários escolhidos como uma comunidade
Brin e Page gostam de pensar o Google como uma comunidade. Sabe aqueles grupos de amigos da faculdade que se reúnem em torno de gostos comuns, em que os novos integrantes precisam passar por uma espécie de prova para ser aceitos? É assim o Google. Existe até uma gíria que designa aquele tipo de pessoa que combina com o espírito da empresa, "Googley". No início do Google, Brin e Page gostavam de entrevistar pessoalmente os candidatos a funcionário. Antes da entrevista, eles tinham de responder a uma espécie de prova. No questionário, além de problemas matemáticos, havia perguntas do tipo: "Qual das alternativas abaixo não combina com os interesses de um Googley?". As alternativas: basquete feminino; fãs de Buffy, a caça-vampiros; jogadores de críquete; vencedores do Prêmio Nobel; clubes de degustação de vinho. Qual a resposta certa? Não existe. "Gostamos de gente que, na soma das respostas, fuja de um padrão previsível", disse Brin numa entrevista. Uma cultura criativa, para ele, é aquela em que não há uma resposta certa, mas muitas respostas possíveis.

4. Incentivo ao risco
Toda empresa tem seu folclore. Uma das fábulas mais repetidas dentro do Google refere-se a uma das vice-presidentes da empresa, Sheryl Sandberg. Numa ocasião, Sheryl tocava um projeto na área de publicidade e cometeu um erro de cálculo. A empreitada, implantada a jato, em consonância com a cultura da empresa, resultou numa perda de US$ 1 milhão - quando o episódio é comentado dentro do Google, ninguém conta qual era o projeto e, questionada sobre isso pela revista americana Fortune, Sheryl não quis revelar. Chateada com o que aconteceu, ela se reportou a Brin. "Sinto-me muito mal sobre tudo isso", disse ela. De acordo com o folclore, Brin teria respondido: "Pois eu fico muito feliz com o que aconteceu. Nesta empresa, caminhamos muito rápido porque corremos risco. Se nunca fracassamos, é porque não corremos risco suficiente". Como boa lenda urbana, a história circula no Google atribuída a diferentes pessoas. Há quem diga que o protagonista é o diretor Richard Holden, da área de publicidade. Ela reflete o espírito de uma empresa em que as equipes costumam ter maior autonomia que a média e o fracasso é em geral considerado parte do processo.

5. Informações compartilhadas
Em 1998, a consultora Shona Brown, da empresa McKinsey, escreveu um livro em que afirma que toda empresa criativa tem de conviver com uma dose de caos. Coincidência ou não, o livro foi lançado no ano da fundação do Google. Não foi por coincidência que, depois de ler o livro, Brin e Page decidiram contratar Shona. Ela hoje ocupa uma diretoria dentro do Google. Um dos princípios básicos das empresas criativas, segundo ela, é a livre circulação de informações. Essa é uma das bases do funcionamento do Google. Quase todos os funcionários têm acesso aos projetos desenvolvidos dentro da empresa. Com isso, todos podem dar palpites sobre as idéias e melhorá-las, num espírito de criação coletiva. A contrapartida disso é que eles guardem segredo.

Entrevistas para veículos de imprensa são desencorajadas. Mesmo as fotos dentro do Googleplex são controladas. No espírito de criação coletiva que reina dentro da empresa, não é incomum que as paredes sejam preenchidas com fórmulas matemáticas que, devidamente interpretadas, podem levar à próxima idéia de bilhões de dólares. É indesejável que algo assim saia estampado nas páginas de um jornal, à vista de cientistas das empresas concorrentes. Os funcionários também podem apresentar suas idéias diretamente ao primeiro escalão. Marissa Meyer, diretora responsável pela área de inovação, recebe três vezes por semana os portadores de novas idéias. As melhores recebem imediatamente o sinal verde para ir em frente.

6. Lançamentos experimentais
Dentro do site do Google existem os "Google Labs", um endereço em que é possível acessar alguns dos projetos desenvolvidos na empresa e opinar sobre eles. Os lançamentos "beta" - nome dado na gíria da computação aos programas lançados antes da fase de acabamento para testar o mercado - acompanham Brin e Page desde a fundação do Google. Quando colocaram no ar o programa de busca da Biblioteca de Stanford, Brin e Page fizeram questão de saber a opinião de todos que o usavam. Foram aperfeiçoando a ferramenta a partir daí. O resultado é o maior sistema de buscas do mundo. A página do Google na internet, completamente branca, com apenas um campo para digitar a palavra-chave, alguns links e o logotipo colorido que caracteriza a marca, foi desenvolvida com base no retorno dos usuários. No início do Google, quando a empresa ainda não tinha receita, Brin e Page receberam várias ofertas para pôr anúncios na página inicial. Recusaram depois de ouvir as opiniões de usuários, a maioria de dentro de Stanford. Eles acham até hoje que essas opiniões ajudam a aperfeiçoar as ferramentas. Por isso insistem nos lançamentos em "beta". Embora seja usado dentro do Google, o termo não é exatamente apropriado. Os testes do Google não são feitos com um público restrito. São disseminados por toda a internet - o campo de testes é o mundo inteiro.

Em vez de vender programas para rodar no microcomputador do usuário, como a Microsoft, o Google dá de graça produtos pela internet. Eles podem ser acessados de qualquer computador - no espírito do que se convencionou chamar de internet 2.0. Alguns softwares lançados pelo Google concorrem diretamente com a empresa de Bill Gates e, com a concorrência, a Microsoft teve de aperfeiçoar seus produtos. A estratégia do Google, ao dar de graça seus produtos, não é apenas invadir o terreno da rival. "Podemos não ganhar dinheiro com todos os produtos que lançamos", disse a ÉPOCA Marissa Meyer, executiva responsável pela parte de inovação na empresa (veja a entrevista no fim da matéria). "Eles servem, em primeiro lugar, para criar uma comunidade de usuários do Google. Os produtos são uma porta de entrada para o programa de busca, nossa principal fonte de receita."

AS IDÉIAS QUE FIZERAM A "RENASCENÇA" NA CALIFÓRNIA

1. A universidade inovadora e o pólo da inovação
O economista Michael Porter, professor da Universidade Harvard e um dos principais pesquisadores da inovação s na economia, é o criador do conceito de cluster, ou pólo tecnológico. Segundo ele, os pólos são regiões que naturalmente encontram vocações para alguma atividade econômica. A partir daí toda a economia - da produção de conhecimento ao comércio - passa a girar em torno dessa atividade. Poucos casos exemplificam tão bem essa teoria quanto Stanford e o Vale do Silício.

Stanford sempre foi uma universidade marcada pela inovação. Lá deram aulas professores como o Nobel de Química Linus Pauling, que desvendou a estrutura do átomo, e escritores como o também Nobel Alexander Soljenitsin, o russo que mostrou ao mundo o lado sangrento da ditadura soviética. No fim dos anos 60, ocorreram em Stanford as primeiras manifestações estudantis contra a Guerra do Vietnã. Hoje, Stanford é a universidade de onde saíram não apenas Brin e Page, mas também David Filo e Larry Young, os fundadores do Yahoo. Em 1996, Bill Gates criou em Stanford um instituto de pesquisas. Mal sabia ele que de lá sairia aquele que é seu principal concorrente hoje: o Google.

Qual o segredo do ambiente inovador de Stanford? Ela leva mais adiante que quase todas as outras universidades dois princípios básicos da academia americana - e que costumam ser heresia no Brasil. O primeiro é o foco no empreendedorismo. Os alunos não aprendem apenas a pesquisar, mas também a implantar suas idéias no mundo real. O segundo é a integração com a economia da região. Os professores não têm vergonha de fazer intercâmbio com empresas nem de apresentar a companhias as idéias de seus alunos.

2. A "rede" da tecnologia
No mundo intercomunicado dos dias atuais, não faz diferença ter uma boa idéia na Índia, na Irlanda ou no Cazaquistão, pois é possível encontrar parceiros para desenvolvê-la em qualquer lugar, pela internet. Certo? Errado. O professor Chong-Moon Lee, coreano naturalizado americano que leciona em Stanford, pesquisou de forma precisa o Vale do Silício. Concluiu que o florescimento tecnológico só foi possível graças à rede de relações pessoais que se construiu na Califórnia.

Professores universitários apresentavam alunos brilhantes a investidores. Investidores ouviam seus projetos e, contagiados pelo entusiasmo e de olho na possibilidade de ganhar dinheiro, financiavam as boas idéias. O próprio Google surgiu assim. Depois de inventar seu método de busca, batizado Page Rank, Brin e Page o patentearam e decidiram vender a idéia por US$ 1 milhão à empresa AltaVista, que trabalhava com programas de busca. O AltaVista não quis comprá-la. Brin e Page pediram então ajuda a um professor da universidade, David Cheriton. Ele os apresentou a um investidor, Andy Bechtolsheim. Na época, 1998, ninguém acreditava que programas de busca pudessem dar dinheiro. Mesmo assim, Bechtolsheim tirou um talão do bolso e preencheu um cheque de US$ 100 mil. Ele disse que "era a primeira boa idéia que ouvia em anos e queria fazer parte dela" e que US$ 100 mil lhe pareceu "um bom número, por ser redondo". O cheque estava em nome de "Google Inc". Brin e Page não haviam ainda criado a empresa. Tiveram de registrá-la às pressas para descontar o cheque. Assim nasceu o Google.

3. A cauda longa
Em São Francisco está a sede da revista que melhor resume o espírito do Vale do Silício, a Wired. Seu diretor, o britânico Chris Anderson, lançou no início deste ano o livro A Cauda Longa. Nele, Anderson afirma que acabou a era da massificação. Hoje, os consumidores sabem exatamente que tipo de produto querem e têm demandas mais sofisticadas. Para atender esse público, os produtores culturais, em todas as áreas, terão de ser cada vez mais específicos. Na capa da edição americana de A Cauda Longa, abaixo do título há uma frase de Eric Schmidt, principal executivo do Google. "As idéias de Anderson influenciam o pensamento estratégico do Google de maneira profunda." O Google, na verdade, entendeu a idéia da "Cauda Longa" muito antes que ela tivesse sido sistematizada por Anderson. Apenas uma idéia garante mais de 95% das receitas do Google. Ela é quase tão genial quanto o programa de busca que hierarquiza os resultados: são os links patrocinados.

Essa idéia - que originalmente nem é do Google, mas de Bill Gross, um inovador que já criou várias empresas no Vale do Silício - revolucionou o mercado de anúncios na internet, ao conseguir atender a demandas específicas de pequenos anunciantes que não eram atendidas pela mídia tradicional. Quando alguém realiza uma busca no Google, s aparecem anúncios à direita da página. Esses anúncios também são hierarquizados de acordo com as palavras buscadas pelo internauta. Na idéia original de Gross, os anunciantes pagavam para que seus sites aparecessem no alto dos resultados das buscas. Ao adaptá-la, o Google também inovou. Passou a usar um critério similar ao do mercado editorial: separou a publicidade do conteúdo da busca. Usando essa política, o Google ganhou credibilidade. Os links patrocinados, pulverizados entre centenas de milhares de anunciantes, são a materialização da idéia central do livro de Anderson: em vez de ganhar muito dinheiro de poucos clientes, o Google ganha um pouco de dinheiro de muitos clientes. Prova de que isso dá certo é o faturamento anual do Google, estimado em cerca de US$ 11 bilhões para 2006, ou algo como um terço de toda a publicidade on-line nos Estados Unidos.

Depender tanto assim dos links patrocinados é uma vulnerabilidade do Google, segundo afirma o especialista em internet John Batelle no livro A Busca: "Eles têm apenas uma fonte de faturamento, e tudo o que puder reduzir essa fonte de faturamento pode destruir a empresa". Batelle diz ainda que cada vez mais empresas e usuários conseguem fraudar o sistema de busca. Mesmo assim, o Google parece ter dinheiro e, mais que isso, uma força inovadora suficiente para vencer essa briga. A leitura do livro de Anderson ainda deixa duas perguntas no ar. Num mundo com demandas cada vez mais específicas, seriam os programas de busca o elo natural entre os consumidores e esses produtos? Será o mercado de anúncios pulverizado como os links patrocinados? Talvez o futuro responda às duas perguntas com uma única palavra: Google.

4. A contracultura
No fim da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos emergiram vitoriosos. Houve, porém, um número grande de traumatizados e mutilados, com dificuldade para retomar a vida normal nos moldes de antes da guerra. Foi nessa época que vários artistas, sem formar um movimento unificado, resolveram empreender uma viagem interior e outra exterior. A viagem interior foi pelo mundo das drogas e das filosofias orientais. A exterior, pelos Estados Unidos. Esta última, de acordo com o poeta Lawrence Ferlinghetti, terminaria em São Francisco por questões geográficas: era o extremo leste do país. Surgia assim a "geração beat", de escritores como Jack Kerouac, Gregory Corso e William Burroughs. "Era o embrião de uma nova América", na análise de Ferlinghetti. Esse novo país emergiria posteriormente com a contracultura e os movimentos de direitos civis. Foi o germe da década que mudou o mundo: os anos 60.

"A Califórnia é o berço de uma cultura que de certa maneira ia na contramão daquilo que os Estados Unidos achavam que eram", diz o ensaísta Paul Saffo, um dos mais respeitados analistas de tecnologia e também professor de Stanford. "Essa cultura valorizava as relações pessoais e não tinha medo do fracasso. Ambas as coisas estão na raiz do sucesso do Vale do Silício, que se construiu sobre uma rede de relacionamentos como não existe em outro lugar dos Estados Unidos e sobre a idéia de que fracassar não era necessariamente um valor negativo, como no resto do país." De acordo com ele, existe algo da paixão estética de Jack Kerouac - resumida no verso "quero casar com meus romances para ter meus contos como filhos" - na obstinação com que os empresários do Vale do Silício se dedicam a suas idéias, mesmo quando elas parecem não ter a mínima chance de dar certo. Exatamente como Sergey Brin e Larry Page quando criaram o Google.

4 PERGUNTAS PARA Marissa Meyer
Uma das vice-presidentes da empresa, Marissa Meyer conhece Brin e Page desde os primeiros tempos em Stanford. Atualmente ela atua focada na área de inovação e é uma das principais executivas do Google

Qual é sua contribuição para tornar o ambiente do Google ainda mais inovador?
Eu instituí no Google uma prática da universidade. As pessoas podem se inscrever para sessões em que mostram seus projetos para mim, como naqueles horários em que os alunos conversam com o orientador. Assim, participo do desenvolvimento das novas idéias. Faço isso três vezes por semana.

O Orkut é um exemplo de produto do Google que não gera renda. Não preocupa vocês depender tanto do programa de busca?
Ele ajuda a dar renda, na medida em que ajuda a formar uma comunidade. Todos os produtos do Google agem de forma integrada, como diferentes portas através das quais os usuários chegam ao programa de busca, onde estão os links patrocinados.

Qual porcentagem da renda do Google vem dos links patrocinados?
Entre 95% e 98%. Metade dos engenheiros da companhia trabalha no aperfeiçoamento do programa de busca.

Qual é a porcentagem de funcionários do Google que trabalham na área de pesquisa e desenvolvimento?
Pode-se dizer que todo o Google é uma empresa de pesquisa e desenvolvimento.

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